domingo, 20 de novembro de 2011

Os carentes

Lembro-me de quando eu não era carente, ou não precisava saber de carência. Eu era criança, eu brincava, lia ouvia, re-ouvia histórias e músicas que eu gostava, eu era quieto, discreto, autônomo; cresci, amadureci, comecei a falar um pouco mais, e quando eu era criança, eu não me preocupava com carência, seja dos amigos, seja dos pais. Ver alguém carente era ver alguém implorando atenção, chamando a todos para ver seu show. Mesmo criança, carência era algo muito apelativo, pelo menos pra mim.

E quando dei-me por conta que a carência era que nem eu? A carência era uma criança tímida, calada, sem querer fazer arte na casa, ou na rua. A carência brincava,  lia, ouvia, re-ouvia histórias e músicas que mais se identificava; ela cresceu, e não amadureceu. Não fala muito, e quando fala, é na hora mais desolada. Minha carência não implora atenção, não chama todos para verem seu show. É uma carência sem identidade.

Mas quando ela vem conversar comigo pra desabafar, desembuchar os seus demônios, eu fico atento para ouvir cada palavra que ela diz. Sempre fui um bom ouvinte, e não será diferente com ela. Quando ela termina de falar, de chorar, de balbuciar, de especular que o mundo é leigo quanto à presença dela, de pensar que seria melhor se ela tivesse pessoas mais atentas à ela; eu digo:

_Que bom que tu veio conversar comigo, porque eu estava sentindo o mesmo. Eu sei que você está sendo machucada por alguém, eu posso dizer pela maneira que você se carrega, se você me deixar- aqui está o que eu farei, eu cuidarei de você.


Assim, eu sempre cuido da carência


Esse texto é inspirado na canção Take Care do cantor Drake.

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